quarta-feira, 20 de abril de 2016

Winnicott, Piaget e democracia




WINNICOTT, PIAGET E DEMOCRACIA
(Alexandra Mello)



Trabalho apresentado como exigência para conclusão do curso de Extensão “Leituras Dirigidas da obra de D. W. Winnicott”, da Faculdade de Ciências Médicas e Escola de Extensão da Unicamp, ministrado pela  Profa. Dra. Eloisa Helena Rubello Valler Celeri


  
O objetivo deste trabalho é demonstrar a importância que Winnicott e Piaget dão ao ambiente, na primeira infância, para a formação de indivíduos capazes de constituir uma sociedade verdadeiramente democrática. Embora tenham percorrido caminhos bastante diferentes, há entre eles pontos que convergem no que diz respeito a essa conquista do ser humano.
Winnicott, ao tentar atribuir um significado psicológico ao termo democracia, sugere que uma sociedade verdadeiramente democrática é constituída por uma maioria de pessoas consideradas maduras do ponto de vista emocional. Para pensar numa sociedade democrática, portanto, é preciso pensar nos seus membros individualmente. Maturidade da sociedade sugere maturidade de uma proporção ideal de membros saudáveis. “A sociedade não passa de uma duplicação maciça de indivíduos” (Winnicott, 1986).
Para o autor, um indivíduo maduro é aquele que apresenta um grau satisfatório de desenvolvimento emocional compatível com sua idade cronológica e o meio em que vive. Haveria uma tendência inata e herdada em direção ao crescimento e ao amadurecimento, até que o indivíduo viesse a se sentir um ser inteiro. No entanto, esse desenvolvimento depende de um ambiente satisfatório, capaz de se adaptar às necessidades do bebê, fase em que está num estado de dependência absoluta, onde o que há, é a unidade mãe-bebê.
A mãe seria a pessoa mais indicada para assumir essa adaptação, em função de um estado que ela desenvolve no final da gravidez e nas primeiras semanas de vida do bebê, e que Winnicott chamou de preocupação materna primária. Essa “doença normal” permite a ela identificar-se com seu filho e assim, reconhecer e atender suas verdadeiras necessidades. No entanto, ele considera que outras pessoas sejam capazes de desenvolver essa capacidade de identificação com o bebê que permite a elas desempenhar essa função. Se essa adaptação acontece de forma suficientemente boa, o bebê pode continuar a ser, sem a necessidade de reagir a invasões do ambiente para as quais não está preparado. O desenvolvimento em direção à maturidade pode então prosseguir da maneira mais harmônica possível e a dependência absoluta vai dando lugar à dependência relativa, em que o bebê começa a desenvolver um sentido de realidade externa.
Nessa transição, deve ter início uma desadaptação gradual da mãe ao bebê, em que pequenas falhas suportáveis favoreçam o processo de desilusionamento. A realidade, até então subjetiva, começa a ser objetivamente percebida e, portanto, compartilhada. O objeto vai sendo agora colocado para fora da área do controle onipotente do bebê. Ele começa a perceber que o mundo criado por ele, já estava ali para ser criado. No entanto, a capacidade de ilusão permanece e possibilita o viver criativo, em que a criança desenvolve a confiança de que o mundo tem aquilo de que ele necessita ou deseja.  
Segundo Winnicott, o ser humano tem uma tendência natural a um padrão de vida democrático. Esta tendência, para ser atendida, depende do desenvolvimento emocional saudável do indivíduo, que por sua vez, depende de uma provisão ambiental adequada. Se uma sociedade tem uma proporção significativa de membros saudáveis, pode-se dizer que há, também nela, uma tendência inata em direção a um sistema democrático. A democracia seria, portanto, o resultado de um grupo de pessoas inteiras, que conseguem compartilhar a realidade.
Em qualquer sociedade ou comunidade, a tendência democrática inata pode ser comprometida em função da presença de indivíduos anti-sociais ou que têm uma tendência imatura a se identificar com a autoridade, para suprir uma insegurança interna. Winnicott considera que, em ambos os casos, a tendência anti-social está presente, só que de uma forma oculta nos membros que se identificam com a autoridade, de forma imatura. Em nenhum dos casos, portanto, pode-se falar em pessoas inteiras (verdadeiro self), já que toda a força conflitante permanece fora do indivíduo.
Há ainda, segundo Winnicott, os indivíduos que não se definiram. O autor sustenta que só uma proporção suficientemente grande de seres saudáveis pode ser capaz de influenciar o maior número dos ”indeterminados”, que seriam então, incorporados a eles. Só assim, a tendência democrática inata estaria garantida.
Para Winnicott, a tendência democrática não deve ser imposta a uma sociedade, mas deve nascer em ambientes que ele chamou de “bons lares comuns”. Os verdadeiros criadores da tendência democrática inata seriam então o homem e a mulher comuns, capazes de construir um lar saudável comum. A maior contribuição que uma mulher e um homem podem dar a uma sociedade, para que ela se torne autenticamente democrática, é construir famílias e bons lares comuns. A mãe, por meio da sua devoção e o pai, oferecendo proteção para que ela consiga ser suficientemente boa em sua tarefa. A maneira como todas as outras pessoas podem contribuir é não interferindo, ou interferirindo da forma menos invasiva possível na dinâmica natural deste arranjo.
O indivíduo maduro de Winnicott, capaz de governar a si próprio, é para Piaget, o indivíduo moralmente autônomo, contrário ao heterônomo, que é governado por outros. No livro “O Juízo Moral na Criança”, publicado em 1932, Piaget discorre sobre a importância da moralidade autônoma. Segundo o autor, toda criança nasce heterônoma e, em condições favoráveis, vai se tornando cada vez mais autônoma. No entanto, esta heteronomia natural é reforçada pelos adultos, o que faz com que o desenvolvimento rumo à autonomia seja interrompido. Esse reforço, normalmente, ocorre por meio de sanções como castigos e recompensas. Se ao contrário, as crianças são estimuladas a exercitar a troca de pontos de vista, conseguem construir por si mesmas os valores morais e tomar as próprias decisões.
No lugar das punições, Piaget defende as sanções por reciprocidade, em que é preciso tentar encontrar uma relação direta entre elas e o ato cometido que precisa ser sancionado. Este tipo de sanção, desde que utilizado num ambiente de afeto e respeito mútuo, motiva a criança a exercitar a coordenação de diferentes pontos de vista. Para o autor, a criança constrói os valores morais internamente, por meio da sua interação com o meio ambiente e não, por imposição, internalizando-os por meio da simples transmissão social.
Em sua concepção, autonomia moral é indissociável de autonomia intelectual e sanções punitivas também podem ser aplicadas nesse âmbito, dificultando que as crianças aprendam a pensar por si mesmas. É preferível possibilitar trocas de pontos de vista com outras crianças, ao invés de simplesmente corrigir os erros cometidos. Quando é corrigida, não tem a oportunidade de chegar ao resultado correto por meio de relações que ela própria estabelece, mas ao contrário, é levada a aceitar passivamente o que um outro sabe e quer lhe transmitir. Não há dessa forma, nenhuma possibilidade de construção.
Segundo Piaget, quando a criança é respeitada na sua maneira de pensar ou de sentir, é encorajada a estabelecer as relações necessárias ao desenvolvimento da autonomia, intelectual e moral. Para explicar seu raciocínio ao resolver um problema matemático, por exemplo, precisa encontrar maneiras de fazer com que o interlocutor entenda e isto certamente, enriquece o seu repertório. Se chegou a um resultado incorreto, ao tentar defender o caminho que percorreu, vai acabar convencida de que está errada.   
Tanto para Winnicott quanto para Piaget, há uma tendência natural no ser humano em direção ao autogoverno, desde que possa contar com um ambiente favorável. Para Winnicott, o indivíduo vai se tornando cada vez mais maduro emocionalmente e independente. Para Piaget, ele vai da heteronomia para a autonomia, tanto moral quanto intelectual. Embora não tenha focado os seus estudos no campo afetivo, Piaget sempre defendeu que há uma relação indissociável e complementar entre conhecimento e afetividade. Os aspectos cognitivos são para ele a estruturação das ações e os aspectos afetivos, a sua energética. Não é suficiente que o sujeito tenha condições para conhecer e aprender, é preciso que ele queira, que seja mobilizado para atingir um objetivo, por meio de uma ação, seja física ou mental.
Embora o objeto de estudo de Jean Piaget, tenha sido a construção do conhecimento pelo ser humano e não o seu desenvolvimento emocional, como em Winnicott, os dois autores parecem se encontrar quando pensam em que tipo de ser humano uma sociedade precisa ter, em sua maioria, para tornar-se autenticamente democrática. Encontram-se também, quando pensam na qualidade estruturante do ambiente da primeira infância, para que isso seja possível. Enquanto Winnicott fala em seres emocionalmente saudáveis, Piaget fala em seres moral e intelectualmente autônomos.
Outro ponto de convergência entre eles é o fato de defenderem que a interferência no processo natural de desenvolvimento do ser humano pode interrompê-lo em algum ponto, impedindo que chegue a alcançar a maturidade, para Winnicott, ou a autonomia, para Piaget.
Winnicott diz que a maior contribuição que a sociedade pode dar a um indivíduo e, portanto, a ela própria de tornar-se um sistema democrático autêntico, é não interferir na relação entre mãe e bebê e no lar comum.
Da mesma forma, Piaget defende que a criança precisa ter a oportunidade de construir internamente uma moralidade autônoma, assim como o conhecimento, no campo intelectual. É claro que uma parte desse conhecimento é social e depende que seja transmitido por outras pessoas, já que é resultado de convenções sociais. No entanto, há o momento certo para que isso seja feito. Um exemplo é o ensino da aritmética. As escolas, ainda hoje, tentam transmitir às crianças os algoritmos (conhecimento social), antes que ela tenha construído internamente noções essenciais a essa aprendizagem (conhecimento lógico matemático). Esta precipitação é uma forma de interferência que vai impedir a construção natural do conhecimento.
No âmbito da moralidade, esta interferência ocorre quando os adultos dizem às crianças o que é certo e o que é errado, ou o que devem ou não fazer, sem dar a ela a oportunidade de construir os próprios valores morais e a partir deles, fazer escolhas que levem em conta pontos de vista de outras pessoas. 
Pode-se concluir que para os dois autores, uma sociedade verdadeiramente democrática, em que a liberdade só é alcançada por meio do respeito mútuo, da cooperação entre pessoas inteiras e da confiança de que as regras deliberadas em grupo serão respeitadas, tem início muito cedo na infância e depende de um ambiente que seja facilitador e estruturante. Ao que parece, Winnicott e Piaget estão de acordo que um sistema democrático não deve ser imposto, mas consequência de uma conquista e de uma construção do ser humano.




BIBLIOGRAFIA


WINNICOOT, D.W. Tudo começa em casa. São Paulo: Martins Fontes, 1986.
_________________ A família e o desenvolvimento individual. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
_________________ O ambiente e os processos de maturação. Porto Alegre: Artes Médica, 1988.
_________________ Da pediatria à Psicanálise. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.
_________________ Natureza Humana. Rio de Janeiro, Imago, 1990.
PIAGET, J. O Juízo Moral da criança. São Paulo: Summus, 1994.
LA TAILLE, Y. Moral e Ética: Dimensões intelectuais e afetivas. São Paulo: Artmed, 2006.
BRENELLI, R.P. Piaget e a afetividade. In: SISTO, F.F.; OLIVEIRA, G.C.; FINI, L.D.T. (orgs.). Leituras de Psicologia para formação de professores. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: Universidade São Francisco, 2000.

         

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Crianças

A melhor maneira de tornar as crianças boas, é torná-las felizes.
Oscar Wilde




"Conta certa lenda, que estavam duas crianças patinando num lago congelado.
Era uma tarde nublada e fria, e as crianças brincavam despreocupadas.
De repente, o gelo quebrou e uma delas caiu, ficando presa na fenda que se formou.
A outra, vendo seu amiguinho preso, e se congelando, tirou um dos patins e começou a golpear o gelo com todas as suas forças, conseguindo por fim, quebrá-lo e libertar o amigo.
Quando os bombeiros chegaram e viram o que havia acontecido, perguntaram ao menino:
- Como você conseguiu fazer isso? É impossível que tenha conseguido quebrar o gelo, sendo tão pequeno e com mãos tão frágeis!
Nesse instante, um ancião que passava pelo local, comentou:
- Eu sei como ele conseguiu.
Todos perguntaram:
- Pode nos dizer como?
- É simples: - respondeu o velho.
- Não havia ninguém ao seu redor para lhe dizer que não seria capaz."

Albert Einstein

quinta-feira, 12 de março de 2015

brincAR


Moro em condomínio. Num desses bem pitorescos que vendem a tal da qualidade de vida, onde crianças podem brincar tranquilamente nas ruas e estarão protegidas da violência lá de fora. Sim. Isso me deixa cheia de conflitos. Afinal, quando escolhemos morar dentro, aceitamos segregar. Segregar pessoas. Trabalhadores honestos. Os mesmos que viabilizam o sonho dos que se sentem “protegidos” lá (aqui) dentro.

Há poucos meses, questionei a administração por que razão empregadas domésticas e pedreiros precisam de antecedentes criminais para seus cadastros, e profissionais como arquitetos, engenheiros, etc...não (não precisam). Não são todos prestadores de serviço? Se a empregada doméstica precisa, o arquiteto também tem que ir atrás do seu. Não? Na verdade, nem um nem outro deveria precisar. A defesa da propriedade não pode justificar a violação dos direitos mais básicos de um trabalhador. Seja ele arquiteto, ou pedreiro. Por indignação, informei que não gostaria de pedir este documento à minha faxineira. E não pedi. Por indignação, mas acho que também para atenuar meus conflitos. Se eu consigo mudar pelo menos isso, minha passagem por condomínio terá valido a pena.

Mas é de outra coisa que eu quero falar. Outra que me inquieta tanto quanto: as ruas vazias de crianças brincando. Bem diferente dos slogans que vendem o paraíso. Onde elas estão? Dentro das casas? Nas aulas extras que enchem o período que não estão na escola? No computador? Na televisão? Quietinhas? Obedientes? Nas salas arrumadinhas? E onde será que elas gostariam de estar? Ou melhor, onde será que elas precisariam estar? É CLARO que brincando. E brincando muito. Na maior parte do tempo. Dentro de casa, fora, na rua, no quintal. Mas brincando. Fazendo barulho. Fazendo de conta. E com outras. Diariamente. E não só nos fins de semana, como fazem os adultos que esperam a semana toda por eles para ter lazer. Trabalho de criança é brincar. E é trabalho muito sério. Privar crianças disso também é violência.

A classe média fica indignada com o trabalho infantil. Defende que criança não pode trabalhar, que tem que brincar. Mas ela faz o mesmo quando não coloca o brincar como a coisa mais importante da vida dos seus filhos. Tão importante quanto todas as outras necessidades básicas, para um desenvolvimento saudável. Físico e emocional. Se uma criança precisa ter suas necessidades básicas bem atendidas para ter, por exemplo, um bom desempenho escolar (e com isso ninguém discorda), então ela também precisa brincar todo santo dia. É como comer. Brincar é necessidade básica.

A origem da palavra brincar é latina e vem de vinculum (laço, vínculo), passou a vinclu, vincru, vrinco e chegou a brinco. Li em algum lugar que brincos eram, na mitologia grega, pequenos deuses que ficavam voando em torno de Vênus, alegrando-a e enfeitando-a. Não consegui comprovar a veracidade dessa informação. Mas é interessante pensar que de vínculo passou a enfeite. Adorno. Que é exatamente o que tem acontecido com o brincar hoje. Ele vem como adorno, como prêmio. Depois que coisas consideradas mais importantes já foram garantidas (estudo, tarefas, aulas de línguas, música, esporte dirigido, etc, etc, etc....).

Nietzsche dizia que “o homem chega à sua maturidade quando encara a vida com a mesma seriedade que uma criança encara uma brincadeira”. Quando uma criança está brincando, algo de extrema relevância está acontecendo. É muito triste ver que a defesa desse direito pode vir a se tornar uma luta política. E mais triste ainda: uma luta diária da própria criança. Uma batalha. Ela precisa de muito pouco pra brincar. De tempo, de parceiros e da permissão do adulto. O resto, ela inventa.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Ao meu adolescente



Eles viram adolescentes e a gente, pais de adolescentes. Pela primeira vez na vida. Parece que virar mãe é tão mais fácil! Tão mais natural. Mais instintivo. Os bebês estão ali. Nossos. Entregues. Quase cabem nas nossas mãos. Já eles, os adolescentes, vão escorregando delas cada dia um pouquinho mais. A gente quer (e tenta) ser modelo, mesmo sabendo que não é. Torce (e cobra) que escolham os caminhos mais corretos. Mais retos. Menos dolorosos. Mesmo sabendo que dores serão inevitáveis. E essenciais. Ser mãe de adolescente tem sido pra mim mais perguntas do que respostas. Às vezes, concordo com alguns que acham que os pais precisam ser amigos dos filhos. Outras, com os que acreditam que pais são pais e não amigos. E nessa confusão, ora sendo amiga ora mãe, vou tentando colocar os tais limites. Mas sem ser autoritária. Dizem (alguns) que é com autoridade que se coloca limites, o que é bem diferente de ser autoritário. Mas na prática, na hora daquele “não” que a gente não sabe muito bem como dizer, é tão diferente! É tão mais difícil do que a gente pensava que seria! Afinal, como é dizer “NÃO!” com autoridade sem ser autoritário? É conversando? Explicando o “não”? Mas daí vem eles. Cheios de argumentos (alguns bem bons). E diante deles (dos argumentos), nossos “nãos” podem ir por água abaixo. Mas dizem (alguns) que a gente PRECISA manter o “não”. TEM que ser firme. JAMAIS amolecer. Mas não pode então rever? Nunca? E quando é aquele “não” que a gente tanto questionou quando foi a nossa vez de tornar nossos pais pais de adolescentes? Daí é uma confusão só. Já sei! É a hora de lembrar que pais são pais e não amigos. E quando a gente acredita que “limite” não é só aquele que a gente tem que colocar. Mas é também aquele que a gente tem que respeitar. O limite DELES. O quarto DELES. O computador DELES. O segredo DELES. Mas daí dizem (alguns) que a gente tem sim que dar uma vigiada, uma “bisbilhotadinha”. Será? Com isso, eu quase nunca concordo. Até porque acho que quando estamos verdadeiramente conectados com eles, não precisamos de sinais. A gente sabe. A gente sente. Só de olhar pra eles. Mas mesmo assim, fica sempre aquela pontinha de dúvida. Será que, ao invés de respeitosa, posso estar sendo negligente? Quantas vezes, a gente se pega ensinando coisas que a gente ainda nem aprendeu direito. E quantas a gente aprendeu até que bem, mas só depois das nossas próprias experiências e não das que tentaram nos passar prontas. Sempre achei que o bom aluno é aquele que pergunta mais do que responde. Por isso, quero seguir cheia de perguntas. Não sei se pra ser amiga ou mãe do meu filho adolescente. Mas pra ser boa aluna e  acertar mais do que errar. E pra quando errar, ter a humildade suficiente pra dizer a ele que errei. Que pisei na bola. Afinal, a gente pede tanto a eles que assumam as coisas. Que nos digam a verdade. Que confiem na gente. Quero seguir confiando nele que até hoje não me deu razões pra não confiar ou me decepcionar. E acho que não vai dar. Obrigada meu filho! Pela pessoa linda que você é e por me encher de perguntas. Um beijo com muito amor da sua mãe. E amiga.


terça-feira, 4 de junho de 2013

Normal, anormal ou doença?




- Quer ouvir o meu projeto? segredou o menino sardento.
- Ah, sim. Ia-me esquecendo. Acabe depressa.
- Eu vou principiar. Olhe a minha cara. Está cheia de manchas, não está?
- Para dizer a verdade, está.
- É feia demais assim?
- Não é muito bonita, não.
- Vá lá. Nem feia nem bonita. É uma cara.
- É. Uma cara assim assim. Tenho visto nas poças d'água. O meu projeto é este: podíamos obrigar toda a gente a ter manchas no rosto. Não ficava bom?
- Para quê?
- Ficava mais certo, ficava tudo igual.

(A Terra dos Meninos Pelados. Graciliano Ramos)

 


Uma criança de 12 anos vai a uma sessão de psicoterapia da irmã mais velha, a pedido da psicóloga. Ao final da sessão, ela (a psicóloga) chama a mãe para dizer que seu filho é hiperativo e pergunta se ninguém havia lhe dito isto antes. A mãe diz que não e então ela encaminha a criança a um colega psiquiatra, em quem diz confiar muito. Os pais, preocupados com o diagnóstico dado, marcam a consulta e levam o filho alguns dias depois, quando o médico já tem em mãos um relatório daquela psicóloga, onde é provável que tenha o diagnóstico de hiperatividade. Provável, porque os pais não tiveram acesso a este documento e, portanto, não conhecem o seu conteúdo. O psiquiatra conversa com os dois e observa a criança enquanto dura a consulta. Isto parece ser o suficiente para que confirme o diagnóstico. Entrega a eles uma receita de “concerta”, estimulante do sistema nervoso central que é utilizado para o tratamento do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), embora o mecanismo de ação terapêutica neste transtorno não seja conhecido, e pede que retornem 15 dias depois para que possam definir um possível aumento da dosagem.

A coordenadora da escola, considerando precipitado o diagnóstico dado pela psicóloga e confirmado pelo psiquiatra, sugere a esta mãe que procure um outro profissional, antes de iniciar a medicação. A mãe, confusa com a divergência de opiniões, aceita a sugestão e vem ao meu consultório. Proponho a ela que não medique o filho até que eu conclua a minha avaliação, que incluiria visita à escola para conversar com professores, anamnese com os pais e algumas sessões individuais com o garoto. Ela diz que me daria um retorno depois de conversar com o marido. Algumas semanas depois, telefona dizendo que resolveram tentar o tratamento com o psiquiatra. Enquanto isso, a coordenadora da escola, com a anuência da mãe, decide ir aos consultórios dos dois profissionais para escutá-los. Ambos confirmam o diagnóstico.  Não se teve acesso  a nenhum laudo dos profissionais. Apenas a alguns relatórios de professores que haviam sido levados pela mãe na primeira consulta com o psiquiatra. Neles, é consenso que o aluno é bastante agitado em sala de aula. No entanto, segundo a coordenação, nenhum dos professores havia se queixado ou pedido que o aluno fosse encaminhado a um especialista.  

Geralmente, a família procura estes profissionais quando a escola faz o encaminhamento, por não saber mais como lidar com um aluno, em função de comportamento agitado, desatento, indisciplinado. Não foi o caso. O que dá mais credibilidade a esta escola. Demonstra que dá conta da diversidade de alunos que possui, sem ter a expectativa de que todos sejam bem comportados, obedientes e adaptados.

A psicóloga deu o diagnóstico de hiperatividade, em função do comportamento do garoto, naquele curto espaço de tempo, dentro das quatro paredes do seu consultório. O psiquiatra confirmou o diagnóstico pela mesma razão e após ler o encaminhamento da psicóloga e os relatórios dos professores.

É muito provável que esta criança preencha os critérios do DSM IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de transtornos Mentais) para TDAH. Ou seja, é possível que apresente os seis ou mais (dos nove) sintomas de desatenção e/ou hiperatividade necessários para a confirmação do diagnóstico, segundo este manual (alguns deles poderiam ser considerados o mesmo). Ainda segundo o DSM, é necessário que estes sintomas persistam “por pelo menos seis meses, em grau mal-adaptativo e inconsistente com o nível de desenvolvimento”. É preciso ainda que algum prejuízo causado por eles esteja presente em dois ou mais contextos e “deve haver claras evidências de prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional”. Será que estes dois profissionais tiveram tempo para assegurar todas essas condições?

A avaliação da conduta de uma criança por um psiquiatra é sempre solicitada por alguém, que não ela mesma. Alguém para quem tal conduta não é adequada. O psiquiatra, diante dela, precisa avaliar seu caráter patológico ou normal. E para isso, não pode ignorar o contexto ambiental em que a criança está inserida (escola, casa, rua, instituição religiosa, etc.).

Na Psiquiatria Infantil, é muito mais difícil estabelecer possíveis relações entre condutas e patologia do que na Psiquiatria Adulta. A criança está em pleno desenvolvimento, e as oscilações entre equilíbrio e descompensações estão presentes, sem que isto tenha necessariamente um caráter patológico. Desta maneira, os sintomas deveriam ser pensados mais em termos do seu efeito organizador ou não para o desenvolvimento da criança do que em termos de normalidade ou patologia. Quando apenas se considera a descrição dos sintomas para se definir o tratamento, corre-se o risco de, removendo-os, eliminar também os benefícios do papel organizador que por ventura eles possam ter.

Muitas vezes uma conduta considerada patológica pode ser uma maneira saudável de protesto ou um sinal de patologia do próprio meio. Uma conduta inabitual pode ainda ter sentidos diferentes dependendo do meio em que ela aparece. Uma mesma conduta pode ser facilmente tolerada por uma família mais flexível, que consegue sem tanto esforço dar conta dela, enquanto para uma outra mais rígida com a educação dos filhos, seria razão para preocupação e busca de ajuda profissional. Da mesma forma, uma família desorganizada e desestruturada pode contribuir para que uma conduta, que teria papel organizador, torne-se patológica.

No campo da psiquiatria, a dicotomia simplista – normal/patológico - deve ser ainda mais evitada do que na medicina somática, já que questões éticas, educacionais, sociais, culturais, religiosas, políticas, entre outras, estão mais fortemente presentes. No caso da Psiquiatria Infantil, esta simplificação pode trazer consequências mais irreparáveis,  por tratar de uma fase da vida em que o psiquismo da criança precisa dar conta dos processos maturacionais, bem como dos processos de desenvolvimento, que envolvem uma série de conflitos inevitáveis e bem-vindos. Estes conflitos podem ser tratados de maneira irresponsável e precipitada como sintomas de patologias a serem curadas.

“Neste estádio, a saúde não é uma ausência de sintomatologia. A normalidade deve ser definida sobre uma base muito mais ampla, que leve em consideração os conflitos essenciais, na sua maior parte inconscientes, que fazem parte da saúde, indicando apenas que a criança permanece viva e vivaz.” (Winnicott, 1988).

A ausência aparente de condutas desviantes no sentido de uma média estatística ou de um ideal a ser atingido, pode refletir uma submissão a pressões do meio por intermédio de comportamentos adaptativos. No entanto, este conformismo pode inviabilizar uma organização psíquica sólida que permita a elaboração dos conflitos previstos nesta fase. Pode-se, a partir disto, questionar-se por que razão há uma predominância de mulheres nos consultórios psiquiátricos, ao contrário do que ocorre na Psiquiatria Infantil, onde a predominância é de crianças do sexo masculino. Esta alternância permite especular que a clientela adulta não é a mesma que frequentou os consultórios psiquiátricos na infância. Será que isto pode ser atribuído à eficácia do tratamento psiquiátrico infantil? Ou será que meninas adaptam-se melhor ao meio, ao contrário dos meninos que confrontam os modelos ideais impostos por uma sociedade que precisa funcionar com a maior eficiência e eficácia possíveis, não permitindo que as pessoas tenham tempo para viver seus lutos, suas angústias e seus conflitos, que bem elaborados só trariam benefícios psíquicos? E resistindo às imposições e repressões, eles teriam mais sucesso em fazer bom emprego dos conflitos organizadores? (Ajuriaguerra; Marcelli, 1986).


...que a experiência de frustrações, de desapontamentos, da perda daquilo que é amado, junto com a tomada de consciência da insignificância e da fraqueza pessoais, formam uma parte significativa da educação de uma criança; e que, certamente, a educação deveria ter como objetivo de grande importância tornar a criança capaz de sair-se bem na vida sem ajuda. (WINNICOTT, 1988: p. 71).

 
O psiquiatra do caso acima relatado que, rapidamente, diagnostica o comportamento daquela criança, aproxima-se mais dos profissionais da medicina somática que se preocupam mais em remover o sintoma do que em compreender que sentido ele tem. Ele adota o ponto de vista que define o anormal como oposto à saúde e, portanto, indício de uma patologia a ser curada por um medicamento. Neste caso em questão, não havia sequer uma queixa que incapacitasse a criança ou perturbasse o ambiente familiar ou escolar. Ao fazer esta opção, o psiquiatra abre mão do que deveria ser um dos seus principais recursos: a escuta.

Para Winnicott, a anormalidade está mais associada a uma limitação da criança em fazer bom uso do sintoma para se defender das angústias e conflitos previstos no desenvolvimento, do que à presença dele.

 
O psiquiatra não é portanto, um curador de sintomas; ele reconhece o sintoma como um sinal de socorro que justifica uma investigação completa da história do desenvolvimento emocional da criança, relativo ao seu meio ambiente e a sua cultura. A finalidade do tratamento é aliviar a criança da necessidade de enviar o sinal de socorro. (WINNICOTT, 1988: p. 212).

 
Canguilhem (1904) afirma que o patológico é anormal, mas o anormal pode não ser patológico (pathos, que implica sofrimento), e sim adaptativo. Para Winnicott, as fobias da infância e os comportamentos de ruptura na adolescência caracterizam-nas como normalmente patológicas. E patologicamente normais seriam, por exemplo, os filhos hipermaturos de pais psicóticos. Estes autores demonstram a complexidade para definir conceitos como normalidade, anormalidade e patologia e a impossibilidade de estabelecer fronteiras entre estes estados.

 
deve-se então reconhecer o sintoma, avaliar seu peso e função dinâmica, tentar situar seu lugar no seio da estrutura e, enfim, apreciar essa estrutura no âmbito da evolução genética e no seio do ambiente. É dessa quádrupla avaliação sintomática, estrutural, genética e ambiental que procede todo procedimento psiquiátrico. (AJURIAGUERRA; MARCELLI, 1986: p. 49).

 
O que aqueles profissionais sabiam daquela criança que tão facilmente diagnosticaram? O que sabiam da escola daquela criança, daquela criança na escola, daquela criança com os pais, dos pais daquela criança? De como ela se desenvolve, do que sente, do que faz e o que sonha? Das qualidades que ela tem, das reações que o meio provoca nela, de como ela brinca com os amigos, de como é quando não está agitada num consultório com pessoas desconhecidas? O que investigaram e o que compreenderam sobre o que aquele comportamento agitado podia estar querendo dizer? Que hipóteses levantaram? Que respostas não tiveram e que tempo esperaram pra encontrá-las? O que conheceram dela? Parece que quase nada. Não teriam tido tempo. Mas mesmo tendo conhecido tão pouco dela, identificaram uma patologia a ser tratada. E é provável que saibam muito bem descrevê-la. E rapidamente querem curar a criança que não conhecem. Enquadrá-la na média estatística ou num modelo ideal imposto por uma sociedade que precisa de seres conformados e adaptados (o que acaba coincidindo com a média estatística). Querem que ela seja a criança fácil, conformada, silenciosa. A que não dá trabalho aos professores, que não os questiona, que não os desafia. Querem consertá-la. Ou melhor, conCertá-la. E quem está fazendo isto com as crianças é justamente aqueles que deveriam protegê-las dos estigmas e das pressões. Elas não têm autonomia e vão para onde são levadas, correndo o risco de se tornarem aquilo que outros vêem nelas e sabem delas. Sem conhecê-las.

 

 

 

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Vovô Chico

Quando escutava alguém dizer “melhor idade” (para a terceira), ficava indignado. “Como assim melhor idade?”. Um dia escutou pior. Que haveria um concurso pra eleger a rainha do clube da melhor idade. Não se conteve. “O que????? Concurso pra rainha da melhor idade?????? RI-DÍ-CU-LO. Vcs só podem estar de brincadeira comigo!!!!”. Pedir a opinião dele, nem sempre era uma boa idéia. Porque ela seria dada meeeeeesmo. E muitas vezes, era preciso ser forte pra aguentar escutá-la. Porque, com certeza, ela viria na sua forma mais bruta, sem nenhum tratamento, sem nenhum tipo de disfarce. Mas podia acontecer também de ser gostoso escutá-las. A ênfase que ele dava quando dizia que alguma  coisa era “RI-DÍ-CU-LA”, era a mesma que dava quando gostava de outra. Daí era “A COI-SA MAIS LIN-DA DO MUN-DO!!!!”. Discussões com vizinhos que cortavam árvores, eu vi algumas. A gente até esperava o dia em que subiria numa delas pra evitar. E o dia em que um dos vizinhos (um que não queria árvore na porta da sua casa porque árvores sujam) parou o carro na sombra da nossa? Ele não acreditou naquilo. Tinha razão muitas vezes, mas acabava perdendo por conta da maneira intempestiva com que a defendia. Esse era o meu pai, que depois de 70 dias no hospital, 40 deles na uti, morreu na última sexta-feira. Foram dias muito difíceis pra todos nós. É como se a vida ficasse suspensa. Como se ficasse pra depois. Uma mistura de sentimentos. E muitas, mas muitas reflexões. Pensei muitas vezes, por exemplo, até que ponto a vida de alguém deve ser esticada graças a todos os recursos que o avanço tecnológico e da medicina permitem. É vida ou sofrimento que se estica? E a morte natural, o que é? O que passou a ser? Ao mesmo tempo, como era bom chegar na UTI na hora da visita e saber que mais um dia ele tinha dado conta de viver. Que não tinha ido embora. E o coma induzido (que hoje se diz sedação)? Será que ele podia nos escutar? Será que tinha dor e não conseguia expressar porque a sedação não permitia movimentos? Foi chegando a hora da extubação, mas pra isso precisaria da traqueostomia. Os movimentos e a consciência começariam então a voltar, mas daí era voz que não teria mais. Que alívio eu senti quando soube que havia medicamentos amnésicos para que ele não lembrasse depois, de tudo que estava vivendo ali. Seria muito traumático. Mas e então? Será que não sentiria dor se ficasse sem a sedação? Será que não ficaria triste? Desesperado? Quantas perguntas fizemos! Eram duas visitas por dia, de meia hora cada uma. Na primeira, o médico de plantão ia passando de leito em leito, pra dar às famílias o boletim do dia. Foram 40 dias. Foram 40 boletins. E minha mãe guerreira não perdeu nenhum. Não pulou nenhum dia de visita. Nenhunzinho. E todos os dias, conversava muito com ele. Estivesse dormindo ou não, sedado ou não. Explicava com a voz baixinha o que estava acontecendo. Fazia carinho, molhava os lábios dele, porque achava que podia estar com sede. E rezava com as mãos cheias de boas energias na testa dele. Rezava muito. Até uma "flor de maio" que ele gostava tanto e que nascia, religiosamente, no mês de maio no jardim da casa deles, ela levou de presente. Ele não foi uma pessoa fácil não. Era rebelde, intransigente, crítico demais. Foi ao longo dos anos, desiludindo-se com tudo. Com o futebol, com a política, com o homem, com a lógica do capitalismo, com os produtos cada vez mais descartáveis. Era um saudosista. Coisas boas, eram as antigas. Os opalas que teve, os LPs, as músicas... Mas da natureza nunca desistiu. Era incapaz de viver sem ela. Teria morrido muito antes, se não a tivesse por perto. Se não fossem os saguis que iam comer banana na mão dele, se não fossem os pássaros, as árvores todas, o gramado, o cheiro de terra. Também não ficava sem a oficina que ele mesmo construiu no fundo da casa. Passava horas ali, fazendo suas invenções. A última delas era um mini cortador de grama (que funcionaria de verdade) para o Gabriel que tinha pedido um de presente. Não deu tempo de dar o cortador. Não deu tempo de ver nascer a flor de maio nesse maio. Mas no próximo, elas vão nascer ainda mais bonitas. E vamos todos lembrar do quanto ele cuidou bem delas. E à sua maneira, de todos nós. 

domingo, 3 de fevereiro de 2013

A escola do meu filho fechou

 
              Bares fecham. Lojas fecham. Restaurantes fecham. Hotéis fecham. Farmácias fecham. Cinemas fecham. Hospitais fecham. Gráficas fecham. E escolas, também fecham. Simplesmente, fecham. Afinal, ninguém abre escola só porque ama educação. Pessoas abrem escolas também porque querem ganhar dinheiro com escolas. Abrem um negócio. E quando não ganham, ou quando perdem, fecham. Mas dessa vez, não foi qualquer escola que fechou. Foi a escola do nosso filho Gabriel. A mesma que foi do nosso filho Pedro, durante 11 anos. Onze é bastante (quase tudo) pra quem só tem 16.

               Desde que viemos de São Paulo pra Vinhedo, em 2000, já estamos na terceira casa. Mas de escola, nunca mudamos. Era sempre o quintal das nossas casas. Com tudo que um quintal de verdade tem. Tartaruga, pés de frutas, folha seca, árvores pra subir, esconderijos secretos, mato, cheiro de chuva quando chove, chão batido. A escola que quase sempre teve a Tati, que teve a Pri, a Lia, a Anita, a Mi, o Seu Orlando jardineiro, a Marina morena, a Nádia, o Gu, a Manu, o Thiago, o Thiagão, o Ban Ban, o Seu Brandão, a Bel, a Geruza, a Wal, a Claudinha e o Leite, a Monica...... A escola que teve de tudo. Até mesmo greve de professores que durou um dia só.  A que já se chamou “Nosso Cantinho” quando era da tia Cleimar e do tio Luiz. A vó Marta, mãe da tia Cleimar, escrevia os recadinhos nas agendas das crianças. Todos os dias algo assim: “papai e mamãe, hoje eu brinquei muito, tomei todo meu lanchinho e me diverti bastante.......”. E eu pensava, “mas poxa, será que precisam escrever como se fosse a criança escrevendo, será que é isso mesmo que o Pedro teria escrito, se já soubesse escrever?” Ele era tão feliz ali, que eu acho que sim. E aquilo passava a ser só um detalhe.

               O “Nosso Cantinho”, pra crescer um pouquinho, virou Anglo Campinas, e de cantinho da tia Cleimar foi virando outra coisa. Mas o Pedro, de tão feliz que estava, bateu o pé e quis continuar ali, onde não admitiriam mais bilhetinhos em primeira pessoa, nem que professoras fossem tias. A casa avarandada da família Gasparini virou o térreo do prédio moderno do Anglo. O logotipo com o desenho de uma casinha deu lugar ao leão já conhecido. E a tia Cleimar foi embora. O motivo não vem ao caso. E na verdade, eu nem sei direito. Ouvi várias histórias diferentes na época.  Mas é provável que tenha ido porque cantinhos não combinam muito com empreendedorismo. Cantinhos são pros que limitam a ambição, pros que não precisam de muito pra serem felizes. A tia Cleimar e o tio Luiz encontraram outro cantinho. Diferente daquele que, mesmo tendo virado Anglo, nunca perdeu seu charme, seu cheiro de mato. Dizem que era condição do Gasparini que a natureza fosse integrada a qualquer que fosse o novo projeto. Podiam subir prédios, mas jamais derrubar árvores. Conseguiram. Como disse um dos pais, conseguiram harmonizar modernidade com o estilo fazendinha.

               Depois de algumas crises e de muitos alunos perdidos, a escola resolveu abaixar as mensalidades, na tentativa de atrair novos alunos e manter os que ainda não haviam saído. A escola lotou naquele ano. Mas novas crises vieram e o Anglo Campinas virou Anglo Campinas COC. Sistema COC de ensino. Fora a lousa digital, pouca coisa mudou. As mensalidades baixas foram mantidas. Muitos se perguntavam: como sobreviveriam com aquelas mensalidades tão abaixo do valor de mercado.? Mas nenhum de nós (a mensalidade do Pedro foi cortada pela metade.......que bom!) cogitou pagar mais ou manter o que já se pagava. Nenhum de nós questionou se aquela seria a melhor estratégia, mesmo questionando todo o resto, o tempo todo. Consequências? Atrasos nos pagamentos, professores insatisfeitos, cortes, nova evasão de alunos. Mais crises. Não sobreviveram.

               E agora, alguns me perguntam se não vamos processá-los já que foram tão, acima de tudo, anti- éticos. Afinal, dias antes de começarem as aulas, avisaram-nos que novos mantenedores assumiriam, mesmo tendo todas as matrículas feitas e as parcelas de janeiro pagas. Por impedimento legal, também não assumiram. Teriam que assumir todo o passivo. Resultado? Centenas (acho que não mais que duas) de pais à procura de uma nova escola para seus filhos. No nosso caso aqui, à procura de uma que o ajudasse a ser feliz. E pra nós, uma criança, pra ser feliz, precisa brincar. Brincar muito. Quase o tempo todo. Precisa de quintal. De pés de frutas, folha seca, árvore pra subir, esconderijos secretos, mato, cheiro de chuva quando chove, chão batido. Da tartaruga, a gente até abre mão. Até porque, tem uma no quintal da vovó Ada e do vovô Chico. Mas não abrimos mão de deixá-lo ser como passarinho.  Pra viajar muito e inventar um quintal, se não houver um de verdade.

               Não. Não vamos processá-los. Pode ter havido erro no lugar de má intenção. E erros nem sempre são cometidos pra se fazer o mal. Ganhamos ali bem mais do que perdemos. Não queremos carregar ressentimentos e andar pesados. Preferimos as boas e leves recordações.

 

domingo, 1 de abril de 2012

De volta à Praça da República

1991. Eu tinha 23 anos e estava no terceiro ano da faculdade de Psicologia da PUC-SP. Deslumbrada com a liberdade que sente quem sai da casa dos pais no interior e começa a morar sozinha na capital, eu achava que mudaria o mundo. Só ainda não sabia como. Por onde começar. Até o dia em que recebi da Martinha, o convite irrecusável para quem tinha tal pretensão. A Martinha é uma daquelas amigas de quem a vida nos afasta, mas que basta um encontro pra se retomar ao ponto onde paramos, como se o espaço intermediário fosse apenas um detalhe. Aceitei o convite prontamente.

Dali em diante, eu teria o status de educadora de rua. “Suuuuper legal” para uma estudante de psicologia da PUC, para quem as experiências fora da sala de aula eram sempre bem mais vibrantes. Trabalharíamos, eu e mais três colegas, com os meninos de rua, moradores da Praça da República. Era um projeto da PUC, em parceria com a Secretaria do Bem Estar Social. Stela Graciani (que provavelmente, continua até hoje mudando o mundo), era a nossa coordenadora toda engajada, que nos levava aos eventos mais bacanas e nos apresentava às pessoas mais importantes daquele universo. Era o máximo ir a reuniões na OAB, nas secretarias municipais, com o Padre Julio Lancelotti, na polícia, na Pastoral do Menor ou em igrejas para reinvidicar espaços físicos para trabalhar. E, todos os dias, durante um ano, ir até a Praça da República para encontrar meninos e meninas de rua.

Alguns eram mais acessíveis. Outros, bem mais desconfiados. Não tínhamos muito claro o que da nossa presença ali traria algum resultado, e muito menos que resultado seria. Se eu era uma educadora de rua, a proposta era educá-los. Mas educá-los como? O que significava educar meninos de rua, na rua? Ou no coreto da praça, onde dormiam. Fazíamos grupos de estudo para ter estas respostas. Líamos sociólogos, antropólogos, psicólogos. Mas quando estávamos ali, na rua, com aquelas crianças tão desamparadas e, ao mesmo tempo, tão destemidas, é como se aquelas leituras todas não fizessem muito sentido. Aquela ferida social escancarada na nossa cara nos deixava confusos, esperançosos, amedrontados, desanimados, culpados, agradecidos. Tudo isso misturado, com momentos de maior e menor lucidez.

Talvez, estivéssemos tão perdidos quanto eles. Com uma diferen;a. Nós tínhamos cama quentinha. Comida farta à mesa. Família. E foi no calor da minha família que eu senti talvez a primeira grande dor pelo outro. Naquele momento, eu me dei conta do tamanho da solidão daquelas pessoas. Eu estava em Campinas, num fim de semana, jantando com os meus pais, quando veio a imagem de um dos meninos do coreto chorando sozinho, sentado num banco da praça, depois da festa de aniversário que fizemos para ele. Decoramos o coreto como se decora uma casa em dia de aniversário de criança. Bexigas, língua de sogra, docinhos, bolo, música. Todos os meninos foram convidados e foi uma festa linda. Mas algumas horas depois, a festa acabou e a dura realidade daquele menino de 8 anos (de quem eu me lembro perfeitamente) estava de volta. À noite, não me lembro por que razão, voltamos para a praça e lá estava ele, sentado no banco chorando baixinho. Quando, no meio do jantar farto, esta imagem veio à minha cabeça, eu sai chorando da mesa e fui para o meu quarto. Meu outro quarto. Eu tinha dois. Um em São Paulo e um em Campinas. Minha mãe foi atrás de mim, me abraçou forte e esperou que eu terminasse de chorar para perguntar o que havia acontecido. Eu dizia a ela que aquilo não podia de jeito nenhum existir. E que nosso trabalho era quase nada perto da miséria humana.

Os anos se passaram, eu não mudei o mundo e perdi muitas das certezas ingênuas que eu tinha naquele momento. Mas tenho uma que se torna cada vez mais inabalável, embora para muitos, seja tão ingênua quanto aquelas. A de que uma das melhores maneiras de mudar o mundo é criar filhos que sejam capazes de se sensibilizar com o drama do outro. E quando eu escuto o meu de 15 anos pedir pra ver de perto a Cracolândia e lá estando, percebo o quanto ele está tocado por aquilo, eu constato que alguma semente eu estou deixando para um mundo melhor lá na frente.

(O que me trouxe de volta todas estas lembranças foi o documentário produzido pelo Marco (para os poucos leitores não amigos, Marco é meu marido) e pelo Gustavo Costa, repórter “sem rosto” da TV Record. Por dois meses ficaram mergulhados nesse projeto que acaba de ser concluído e deve ir ao ar no Domingo Espetacular da Páscoa. Eu vi a versão maior, antes que tivesse que ser cortada, para se encaixar na programação. Ele ficou menor, mas ainda assim grandioso o bastante para nos causar espanto. E eu acredito que causar espanto seja mesmo o objetivo destes dois jornalistas. Além, é claro, de produzir um produto jornalístico de qualidade. Mais informações sobre o documentário, no DoLaDoDeLá)

terça-feira, 22 de novembro de 2011

"SIGOTA MÃ DIUMACATA"



"SIGOTA MÃ DIUMA CATA"
"Se gostar mande uma carta"

Lembra disso Pedro? Você estava começando a escrever. Eu gostei muito meu filho. E aqui está ela. A minha carta. Uma carta simples pra dizer que eu adorei esse mundo que você desenhou na contracapa do meu caderno. Que eu adorei o adesivo de flor que você fez pra mim, e que eu coloquei na outra contracapa (você fazia adesivos pra vender lembra?). Uma carta simples pra dizer que eu adorei a casa cheia de alegria durante todos estes anos. Pra dizer o quanto eu gostei das suas notas. E muito mais do que das suas notas, o quanto eu gosto da sua sensibilidade. Da maneira ética e discreta como você se relaciona com as pessoas. Da sua capacidade de fazer amigos e cuidar bem deles. Uma carta simples pra dizer que eu não mudaria nada em você. Que é você assim, desse jeitinho, que nós amamos tanto. Pra dizer o quanto eu fico feliz por você gostar tanto de música. Por ser tocado pelas desigualdades do mundo. E por querer tanto um mundo melhor pra todos. Pra agradecer pela paciência que você teve com a chegada de um irmão, depois de tanto tempo sendo o único. Pra dizer que só o tempo disponível é que foi dividido entre vocês. Mas não o amor. Pra dizer que eu vou torcer sempre pelo seu sucesso, mas muito mais pela sua felicidade. Pra pedir desculpas pelos momentos de impaciência e de cansaço. Pelas broncas que eu não deveria ter dado. Pela ausência em momentos que você precisava de maior presença. E pra dizer que eu vou torcer muito pra que você conheça o mundo inteiro que você desenhou naquele dia.
Uma carta pra dizer que eu te amo muito.

Parabéns pelos 15 anos e pela formatura!



A música que te leva de volta pro "Nosso Cantinho".

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Afinal, o que é que está precisando de conserto?

Imaginem a seguinte situação: uma criança de 12 anos vai a uma sessão de psicoterapia da irmã mais velha, a pedido da psicóloga. Ao final da sessão, ela (a psicóloga) chama a mãe para dizer que seu filho é hiperativo e pergunta se ninguém havia lhe dito isto antes. Encaminha a criança a um psiquiatra. Ou melhor, AO psiquiatra. O que ela conhece e em quem diz confiar muito. Os pais marcam a consulta e levam o filho alguns dias depois, quando o médico já tem em mãos um relatório daquela psicóloga, onde é provável que tenha o diagnóstico de hiperatividade. Digo provável porque os pais não tiveram acesso a este documento e, portanto, não conhecem o seu conteúdo. O psiquiatra conversa com os dois e observa a criança enquanto dura a consulta. Isto parece ser o suficiente para que confirme o diagnóstico. Entrega a eles uma receita de “concerta” (pelo menos não é com “s”), estimulante do sistema nervoso central que é utilizado para o tratamento do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), embora o mecanismo de ação terapêutica neste transtorno não seja conhecido. Pede que retornem 15 dias depois para que possam definir um possível aumento da dosagem.
Pois bem. Isto aconteceu. Esta mãe chegou ao meu consultório encaminhada pela escola do garoto que considerou precipitado o diagnóstico feito pela psicóloga e confirmado pelo psiquiatra. Veio antes do retorno a ele, por ter ficado confusa com as divergências de opiniões. Geralmente, a família procura estes profissionais quando a escola faz o encaminhamento, por não saber mais como lidar com um aluno, em função de comportamento agitado, desatento, indisciplinado. Não foi o caso. O que, na minha avaliação, dá pontos a esta escola. Isto demonstra que ela dá conta da diversidade de alunos que possui, sem ter a expectativa de que todos sejam bem comportados e obedientes.
A psicóloga deu o diagnóstico de hiperatividade, em função do comportamento do garoto, naquele curto espaço de tempo, dentro das quatro paredes do seu consultório. O psiquiatra confirmou o diagnóstico pela mesma razão e após ler o relatório que recebeu dela e de alguns professores da escola. Entre estes, é consenso que o aluno é bastante agitado em sala de aula. No entanto, em nenhum momento algum deles pediu à Coordenação que ele fosse encaminhado a um especialista.
Acho muito provável que esta criança preencha os critérios do DSM IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de transtornos Mentais) para TDAH. Ou seja, é possível que apresente os seis ou mais (dos nove) sintomas de desatenção e/ou hiperatividade necessários para a confirmação do diagnóstico, segundo este manual (por sinal, na minha opinião alguns deles deveriam ser considerados o mesmo, mas isso vale uma outra postagem). Ainda segundo o DSM, é necessário que estes sintomas persistam “por pelo menos seis meses, em grau mal-adaptativo e inconsistente com o nível de desenvolvimento”. É preciso ainda que algum prejuízo causado por eles esteja presente em dois ou mais contextos e “deve haver claras evidências de prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional.” Ou seja, será que estes dois profissionais tiveram tempo pra garantir todas essas condições?
O que eles sabem dessa criança, da escola dessa criança, dessa criança na escola, dessa criança com os pais, dos pais dessa criança? De como ela se desenvolveu, do que sente, do que faz e o que sonha? Das qualidades que ela tem, das reações que provocam nela, de como ela brinca com os amigos, de como é quando não está agitada num consultório com pessoas desconhecidas? Acho que quase nada. Mas querem consertá-la. Ou melhor, conCertá-la. O que me indigna é que quem está fazendo isto com as crianças é justamente quem deveria protegê-las dos estigmas. Elas não têm autonomia e vão pra onde são levadas. E correm o risco de se tornarem aquilo que outros vêem nelas. Sem conhecê-las.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Como explicar?

Se
2 elevado a 1 é igual a 2 (2)
2 elevado a 2 é igual a 4 (2x2)
2 elevado a 3 é igual a 8 (2x2x2)
2 elevado a 4 é igual a 16 (2x2x2x2)
2 elevado a 5 é igual a 32 (2x2x2x2x2)
e assim sucessivamente...

Por que então o 2 elevado a 0 é igual a 1? (e não a 0 ou a nada ou a nenhum dois ou, simplesmente, uma potência inexistente)

Tudo bem, se fizermos o caminho contrário, dá pra entender:

32 é o dobro de 16, que é o dobro de 8, que é o dobro de 4, que é o dobro de 2, que é o dobro de 1 (que é o 2 elevado a 0). Faz todo sentido.
Mas se o número do expoente é o número de vezes em que se deve multiplicar a base por ela mesma, quando o expoente é 0, a base não deveria ser inexistente? Não deveria ter 2 nenhum ali!! Por outro lado, o 2 ESTÁ ali. Isso é fato.

Como explicar isso a um aluno? Ou antes, como entender isso?
Algumas coisas a gente tem mesmo é que aceitar e pronto né?
Aceitar que 2 elevado a 0 é igual a 1 e ponto final.
Aceitar isso, até que é fácil.
O duro é não entender na vida porque algumas coisas são como são.
E porque algumas coisas que deveriam simplesmente inexistir, teimam em existir.
E sem as explicações convincentes.
O jeito é aceitar do mesmo jeito que temos que aceitar o 2 elevado a zero.
E desistir de entender.

sábado, 13 de agosto de 2011

Aos pais

Impressionista

(Adélia Prado)



"Uma ocasião,

meu pai pintou a casa toda

de alaranjado brilhante.

Por muito tempo moramos numa casa,

como ele mesmo dizia,

constantemente amanhecendo".
















O meu pai não pintou de alaranjado brilhante a minha casinha de bonecas e nem o rancho do meu irmão. Mas, por muitos e muitos anos, amanhecemos felizes ali, ao lado dele e da nossa mãe.



Que bons momentos e boas lembranças como esta preencham o domingo de todos nós.

domingo, 3 de julho de 2011

Pra Julia


É sempre a si mesmo e a seu sentimento que deve dar razão
contra toda explanação, comentário ou introdução dessa espécie.
Mesmo que se engane, o desenvolvimento natural da sua vida interior
há de conduzi-lo devagar, e com o tempo,
a outra compreensão.
Deixe a seus julgamentos sua própria e silenciosa evolução
sem a perturbar:
Como qualquer progresso,
ela deve vir do âmago do seu ser
e não pode ser reprimida ou acelerada por coisa alguma.
Tudo está em levar a termo e depois, dar à luz.
Deixar amadurecer inteiramente,
no âmago de si,
nas trevas do indizível e do inconsciente,
do inacessível a seu próprio intelecto,
cada impressão e cada germe de sentimento
e aguardar com profunda humildade e paciência
a hora do parto de uma nova claridade.
Aí o tempo não serve de medida:
um ano nada vale, dez anos não são nada.
Amadurecer como a árvore
que não apressa sua seiva
e enfrenta tranqüila as tempestades da primavera,
sem medo de que depois dela não venha nenhum verão.
O verão há de vir.
Mas virá só para os pacientes,
que aguardam num grande silêncio intrépido,
como se diante deles estivesse a eternidade.
Aprendo-o diariamente no meio de dores a que sou agradecido:
a paciência é tudo.


(Rainer Maria Rilke)

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Será que não pode mesmo?

Muita gente acha que as crianças, desde muito cedo, precisam ter claro sobre o que podem e o que não podem mexer. Há os pais que se recusam a mudar qualquer detalhe da decoração da casa, porque acreditam que os filhos é que precisam se adaptar ao ambiente. As brincadeiras deles devem se limitar ao quarto cheio de brinquedos. Mas será que os brinquedos que costumamos dar a eles atendem as suas necessidades (cognitivas, afetivas, motoras, sensoriais)? E será mesmo que eles é que devem se adaptar ao ambiente? Não podemos mudá-lo, ao menos por um período, em função da chegada deles? Eles viram de ponta cabeça as nossas vidas e por que a sala de estar tem que continuar a mesma como se nada tivesse ocorrido?
Uma criança que entra na cozinha e pega vários potes de plástico (o que raramente é permitido), para brincar com eles da maneira que bem entender, e com muita seriedade, pode fazer isso para atender alguma necessidade cognitiva, por exemplo. Quando tenta colocar um dentro do outro, está seriando. Quando separa tampas de um lado e potes do outro, está classificando. Quando, depois disso, procura a tampa de cada um dos potes, está fazendo correspondências. Está quantificando, comparando e, principalmente, escolhendo de que forma quer ou pode desenvolver essas noções. Noções que, lá adiante, serão pré-requisitos para aprender a matemática. No entanto, nós adultos temos receio de que, ao permitirmos isto, estaremos cedendo aos seus caprichos e vontades. Ela pode crescer sem limites, achando que pode fazer tudo que quiser. Em primeiro lugar, eu diria que estaremos sim cedendo. Mas mais às suas necessidades e interesses do que às suas vontades. Mas se ela tem, no quarto dela, aquele conjuntinho de cinco potes iguais, mas de tamanhos diferentes, que vem um dentro do outro, por que é que precisa dos potes “de verdade”? Será que o conjuntinho dela desafia tanto assim, como os da cozinha que não estão já arrumadinhos um dentro do outro e nem são assim tão iguais, diferentes apenas nos tamanhos? Será que os da cozinha não oferecem mais possibilidades de arranjos?
E aqueles livros gigantes de arte do papai e da mamãe então? Aqueles que ficam no rack e que raramente alguém usa? Uma delícia fazer com eles quase a mesma coisa que se faz com os potes da cozinha. De jeito nenhum. Os livros de arte? Nunca. Será que os mais especiais não podem ir pra um outro lugar, por um período, até que eles não sejam mais tão sedutores e, por que não, tão necessários? Por que não ficarem ali os que podem ser empilhados, organizados, arrumados, comparados, percebidos, olhados, “lidos”. Os pesados, os leves, os enormes, os finos, os grossos, os retangulares, os quadrados, os que só têm ilustrações, os que têm ilustrações em PB apenas, etc...
É claro que tudo isso depende das peculiaridades de cada família. Difícil esperar de uma família extremamente organizada, que permita uma festa de potes na cozinha. É claro também, que nem sempre estamos disponíveis e com paciência para encorajar as aventuras dos pequenos. Mas com isto eles também vão ter que aprender a conviver. E tem ainda os objetos que são indiscutivelmente proibidos. Os vidros, o fogão (nem perto dele), as facas, os objetos com pontas. Alguns, podemos e devemos deixar fora do alcance. Não deixar que mexam nesses, com o argumento claro e objetivo de que são perigosos, também é prova de amor. Até por isso é que gostam (e precisam) tanto de brincar perto dos pais. Algumas referências nós é que precisamos dar a eles.
Ter as mais diversas oportunidades de exploração é garantia de maior sucesso na aprendizagem da matemática. Não há dúvida disso. Matemática é estabelecer relações. E quanto mais coisas em relação a criança puder colocar, mais fácil pra ela vai ser colocar propriedades abstratas em relação lá na frente. Além disso, se olharmos pra estas incansáveis buscas das crianças como resultado de necessidade e não de capricho ou mimo, estaremos também favorecendo um desenvolvimento emocional mais saudável, porque estaremos compreendendo-as e não apenas ocupados em “colocar limites”. Até porque, limites também devem ser superados. Desenvolver-se é superar limites e não apenas respeitá-los.

sábado, 21 de maio de 2011

Uma boa conversa

_ Você conhece o J. da sua escola?

_ De que ano?

_ Sétimo.

_ É um de cabelo bem raspadinho?

_ É. (a inicial do nome e as características da criança não são verídicas)

_ Conheço. Nossa, ele é tão chato mãe!

_ Por que?

_ Ah. Sei lá.

_ Você acha que ele é um aluno vulnerável a sofrer bullying?

_ Acho.

_ Por quê?

_ Ah. Todo mundo fica zoando com ele. Empurram.

_ E você sabia que ele tem uma inteligência acima da média?

_ É mesmo? Mas por que então ele ficou num monte de recuperação?

_ Porque alguma coisa está interferindo no desempenho dele. Não é por falta de capacidade.

_ Nossa! Mas parece que ele tem algum problema, sei lá.

_ Você sabia que pode jogar com ele de igual pra igual? Quatro em linha, combate, dama e até gamão. Ele tem um raciocínio lógico brilhante.

_ Sério?

_ Sério. Ele joga melhor que muitos alunos. Venceria muitos. Seria tão legal se os colegas pudessem conhecê-lo melhor né? Acho que iam se surpreender, você não acha? Que iam descobrir muitas coisas legais nele.

_ Poxa mãe. Vou dar um toque nos meus colegas pra pararem de zoar com ele.

_ Legal filho. Faz isso sim. Todos os lados vão ganhar. Vocês podem descobrir um amigo bem bacana. E olha, ele está sofrendo bastante, viu? Está se sentindo muito sozinho.



Esse é um papo que tive ontem com meu filho de 14 anos e que fez muito bem pra nós dois. Estou trazendo pra cá só pra ilustrar como a gente pode ajudar. E não ajudar quem sofre o "bullying" (entre aspas porque resisto aos rótulos que são cada vez mais utilizados para tratar questões tão amplas), mas os que cometem, ou os que podem vir a cometer ou ainda, os que apenas observam e não sabem o que fazer. E nem mesmo direito o que pensar. Os adolescentes, todos, precisam de mais informação. Não adianta recriminá-los quando acaba de ocorrer um episódio que pode caracterizar bullying. E daí separá-los em dois lados: o das vítimas e o dos vilões. É nos momentos de paz que precisamos conversar com eles para sensibilizá-los e sugerir que se coloquem no lugar de um outro. Na hora que a coisa acontece, as emoções estão à flor da pele e tudo fica muito nebuloso. Vamos perguntar a eles se têm algum colega que pode estar sofrendo, que pode estar triste, sozinho, sem amigos. Vamos escutar o que eles têm a nos dizer sobre tudo isso. E não esperar que cometam ou sofram violência (psicológica ou física) para só então chamá-los pra conversar. Eles esperam isso de nós. Eles gostam de falar sobre isso. Eles precisam. Todos eles. Os que estão agredindo precisam da mesma ajuda que precisam os que estão sendo agredidos. Se com este papo eu conseguir que meu filho sensibilize ao menos dois amigos, já fico muito feliz. Quem sabe esses dois façam o mesmo. E a rede cresce em proporção geométrica. Uma boa maneira de aplicar o conhecimento que a escola tenta transmitir.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A elas



Por Bibi da Pieve
Do blog
Leve um casaquinho!



Recém-nascidas

É como se o mundo ficasse numa bandeja à parte, e a gente fosse se servindo de uma beliscada aqui, outra ali – mas o prato que está na nossa frente, aquele do sustento do dia-a-dia, é mesmo o bebê. Ou a maternidade.

Dizem sempre: “dá um trabalho danado, mas é maravilhoso”. Não é um trabalho “danado”. É um aluguel desmedido, coisa que exige total entrega. Digo isso sem a menor culpa porque é a mais pura verdade. Trabalho danado é escrever um livro. Amamentar e cuidar de um bebê é entrega. Tudo que há em você é derramado num copo, e o conteúdo é bebido (sugado) por aquela criaturazinha. Então você quer ser esperta, ou supermulher, ou seja lá o diabo da sua fantasia, e resolve se espremer um pouco para fazer sair mais algumas gotinhas – na esperança de “sobrar” um pouco.

Nada, não sobra nada. É 100% aproveitado pelo bebê, 24 horas por dia. Quanto maior você se achar, mais entrega haverá. Não sei mais o que é desperdício (de tempo ou de amor) e também não guardo nada: tudo é utilizado. E é freqüente a sensação de que preciso abastecer a despensa, senão me esvaio.

De outro lado, “maravilhoso” é um adjetivo que cabe, mas não preenche. Maravilhoso a gente usa até para um pato assado!

Quando olho para a minha filha, perco os caminhos lineares. Não existe olhar/sentir/pensar/formular/dizer. Não existe ordem, nem mesmo o processo de ordenar. É uma experiência tão direta – a mais direta que já conheci – que até me pergunto se posso chamar de experiência. Talvez seja outro tipo de oxigênio ou uma canção.

Um bocejo dela me boceja inteira, um choro me chora, um sorriso involuntário me transforma em alegria da cabeça aos pés. Como é que o budismo classificaria?
Não sei se vem dela ou de mim. Vai ver que vai de cada uma, somos recém-nascidas – a pequena, experimentando as primeiras sensações; a grande, desarticulando idéias. Não me sinto andando com as pernas, é como se alguma coisa lá pela garganta me guiasse.

Em vez de tropeçar, engasgo.


PS: A minha, até hoje, me fala pra não esquecer o casaquinho.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

A separação dos pais vivida pelos filhos

O texto abaixo foi escrito por uma adolescente, há mais ou menos um ano, quando seus pais decidiram se separar. Ao ler, fiquei muito comovida e impressionada com a qualidade literária. Pedi a ela que me autorizasse publicá-lo aqui, por acreditar que suas palavras tão carregadas de sentimentos pudesse nos ajudar a conhecer a vivência dolorosa e amendrontada dos filhos, quando há uma possibilidade de separação. E o mais bonito: não há no texto, nenhum tipo de julgamento aos pais. O que nos faz acreditar que o outro ponto de vista (o deles) tenha sido respeitado por ela, ou, ao menos, considerado, na hora de expressar sua experiência.
Obrigada por tornar um pouco nossa, a sua aprendizagem.

"‎18 anos de história, de felicidade, de vida, de casamento. E tudo acaba aqui, nessa noite abafada e desorientada .Estávamos atrás da porta, tentando ouvir o menor ruído que saísse daquela pequena fresta . Minha ansiedade finalmente falou mais alto, e resolvi fazer uma atuação barata alegando que estava cansada e com fome. Conseguia... sentir a frieza no ar, sentia o fim. Estava cansada, nervosa e com uma pequena pontada de medo. O medo só era pequeno porque eu tinha a ilusão de um final feliz. O ópio da ingenuidade, da ignorância, da futilidade. O medo.... O medo de ver a realidade. Atirei a primeira pedra.
“Fala logo se vocês vão se separar ou não, porque eu quero dormir”
As palavras saiam de minha boca sem ter noção das conseqüências. Como um suicídio precipitado. Palavras em vão, sem pensamento, sem sentimento. Já sabia o que ouviria a seguir,só tinha medo que eles repetissem para mim. Tinha medo de ouvir esse triste fim em voz alta.
“sim!sim!sim! Se você quer saber se a gente vai se separar, sim!” minha mãe disse aos berros deixando cair pequenas gotas de sua cerveja no chão.
Perdi todos os meus sentidos, quase que por um extinto animal estava no chão chorando toda a água existente no mesmo. Eu gritava, me arranhava, mas parecia que nada disso absorvia aquela dor. Essa dor completamente diferente de todas as dores que já senti. Algo novo, algo forte, algo que destrói. Todas as dores que naquele corpo já havia sentido, eram como cortes de papeis. Minha dor era um tiro no peito, só que não existia médico que a tratasse. Um tiro que não iria se cicatrizar.
Acordei com esses olhos inchados que não eram meus, um olhar apagado que não era o meu. Eu era alguém, que não era eu. A podridão interior conseguiu dominar a exterior. A alegria que antes reinava, agora não reina mais. Os risos que se abrochavam, agora murcham. E os rios de lágrimas, que antes eram secos, agora inundam. Quem é você? Quem é esse ser que sou eu, e não sou? O que serás que serás?
E aquela viola, que antes me entendiava, agora me salvava. E ao ouvir os primeiros acordes, o meu corpo foi simultaneamente se entregando a essa força. Tocava com uma precisão que nunca houve antes. E no meio de toda aquela escuridão, uma chama calorosa foi acesa. Nesse momento eu me senti como se o médico sempre ali parado, fizesse algo. Por mas que não saturado, meu corpo lentamente se restabelecia. E o remédio ali aplicado, tinha nome e sobrenome. Não pronunciava, mas aqueles olhos azuis que me olhavam de forma penetrante lentamente me curavam. Logo, os olhos foram se tornando um rosto, que se tornou um busto, que se tornou um corpo. Um corpo que de forma assustada me encarava indevidamente preocupada. Reconheci-o de imediato, aquela era ela, era aquela que me cura. Marina freire, esse é o seu nome. Esse é o meu remédio."

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

"Temos desterrado a alegria
A terra de onde ela nasce foi asfaltada
O cimento que a asfixia está composto de tédio, abulia, aborrecimento, desesperança.
Não é a tristeza a responsável por amordaçar a alegria.
Tampouco a angústia. Ao contrario, sentir angústia é a prova de que por debaixo do cimento ainda resta terra fértil.
Terra úmida, húmus humano por onde possa brotar a autoria que irá rachando o cimento.
Pelo pavimento do tédio se deslizam facilmente a frustração, a anorexia, a bulimia, a inibição cognitiva, a "síndrome do pânico” e as drogas (as ilegais e também as receitadas).
E os meninos, brincando à intempérie da asfaltada frustração dos maiores, talvez busquem com `inquietude´, `hiperatividade´ e ` desatenção´ algo de terra debaixo do alcatrão. ­
O conhecer, escutar, perguntar, abrir os olhos, falar. Podem fazer sofrer, mas não matar aalegria já que a alegria é o reconhecermos com a possibilidade de mudar e mudar-nos.
Esconder, fechar os olhos, tapar os ouvidos, calar, encapsular, medicamentar... translada, desloca a dor e adoece.
O contrário da alegria não e a tristeza, mas o aborrecimento, o omitir-se, o desaparecer.
A Alegria não é algo "light" que nos infantiliza, senão a força que permite a potencia criativa, incisiva e indiscreta da criança que extraviamos na busca pelo êxito adulto."


Fragmentos sobre la alegría y el aprendizaje
Alicia Fernández
“Psicopedagogia em psicodrama"
Editora Vozes, 2000.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Não há manual para educar filhos

Quando morávamos em São Paulo, nosso primeiro filho, que hoje está com 14 anos, dormia todos os dias no carrinho, passeando por Higienópolis. Eu adorava aqueles nossos passeios noturnos. Quando viemos para o interior, o balanço do carrinho foi substituído pelo da rede na varanda. Se estávamos na casa da avó, sem rede e sem Higienópolis, saíamos de carro pra dar uma volta pela cidade. O segundo filho, hoje com três anos, resiste menos para dormir. Mas teve também sua fase de pegar no sono rodando de carro. Escutei muita música e pensei muito na vida nessas voltinhas. Era gostoso pra mim também. Não acho que estes hábitos tenham causado algum mal. Nunca gostei da literatura que dá receitas de como educar o seu bebê. Faça assim e assado para que seu filho: durma a noite inteira; largue chupeta e mamadeira; não chore de madrugada; mame no peito nas horas certas; coma tudo; etc, etc, etc. Muitas vezes, as fórmulas “mágicas” são extremamente burocráticas e trabalhosas. Você desiste antes mesmo de tentar. Além disso, elas desconsideram as peculiaridades de cada família. Não dá pra exigir, por exemplo, soluções que exijam disciplina e organização, de um casal boêmio. Sugerir que o casal mude de vida? É uma possibilidade. Mas essa mudança levaria tempo e talvez não desse para aplicar os resultados na educação do bebê, que cresce tão rapidamente. O que é ideal pra uma família pode não ser para outra. Há bebês que não querem chupeta. O meu primeiro não quis. Já o irmão, aceitou de cara e ainda precisa dela pra dormir. Tá na hora de largar? Tá. Mas isso vai acontecer já já. Talvez por isso, dormir tenha sido mais fácil pra ele. Lembro que o mais velho acordava às vezes de madrugada pronto pra brincar. O mais novo, se acorda, pega sua “pepê” e logo em seguida, pega no sono novamente. Filhos dos mesmos pais, mas em momentos diferentes. Tivemos o segundo com quase quarenta, e a chupeta, tão pouco recomendada, foi uma bênção. Uma grande aliada. Não há regras rígidas. Não deveria haver receitas. É claro, que o bom senso é sempre bem vindo. Subir e descer o elevador milhões de vezes para o bebê dormir, é extrapolar. Quantas mães são orientadas, burocraticamente, a dar tantas mamadas por dia, de tanto em tanto tempo, sentadas na postura tal, durante tantos meses, olhando e sorrindo carinhosamente para o bebê. "O leite materno é insubstituível e deve ser dado até os seis meses, impreterivelmente". Quantas noites a mãe está sem dormir, se está exausta, se os bicos do seio estão rachados, nada disso importa. Nestes casos, será que não seria preferível uma boa troca entre ela e o bebê, com mamadeira e não seios? Será que não seria mais benéfico do que o leite materno a qualquer custo? Há mães que conseguem, resignadamente, passar por tudo isso e garantir as mamadas até os seis meses. Mas há outras que não conseguem e precisam (e podem) encontrar um outro caminho. Muitas vezes, a orientação de um profissional é necessária. Mas ela só deveria ser dada depois de muito escutar a família. Não se pode pedir aos pais, mudanças que dificilmente conseguiriam cumprir. Isso só traria culpa e mais ansiedade, podendo até acentuar as queixas que os levaram a buscar ajuda. Um casal deve ser estimulado a acreditar que os recursos pra educar um filho estão dentro dele e não nos milhares de manuais que há por aí. Certamente, irão errar em muitas situações. Mas um tanto de condições adversas também pode contribuir para um desenvolvimento saudável.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Rock'n'Roll Lullaby

Uma canção tão singela e que traduz tão bem o amor entre as mães e seus filhos.
Não há como não ser, profundamente, tocada por ela.
E na voz doce da Fernanda Takai fica ainda mais especial.

(tentei encontrar um vídeo de melhor qualidade, mas não achei. Por enquanto, vai este mesmo)

(tradução abaixo)

Rock And Roll Lullaby

She was just sixteen and all alone
When I came to be
So we grew up together
My mama child and me
Now things were bad and she was scared
But whenever I would cry
She'd calm my fears and dry my tears
With a rock and roll lullaby

And she would sing sha na na na na na na na ...
It will be all right sha na na na na na....
Sha na na na na na na na ...
Now just hold on tight

Sing it to me mama (mama mama ma)
Sing it sweet and clear, oh!
Mama let me hear that old rock and roll lullaby

Now we made it through the lonely days
But Lord the nights were long
And we’d dream of better moments
When mama sang her song
Now I can't recall the words at all
It don't make sense to try
'Cause I just knew lots of love came thru
In that rock and roll lullaby

And she'd sing sha na na na na na na na
It will be all right
Sha na na na na na na na
Now just hold on tigh

I can hear you mama, mama, mama, mama
nothing loose my soul
like the sound of the good old rock and roll lullaby


Rock And Roll de Ninar

Ela tinha apenas 16 anos e completamente sozinha
Quando eu nasci.
Então nós crescemos juntos,
Minha mãezinha-criança e eu
Agora as coisas estavam ruins e ela estava assustada
Mas sempre que eu chorava,
Ela acalmava meus medos e enxugava minhas lágrimas
com um rock de ninar

E ela cantava sha na na na na na na na ...
Vai ficar tudo bem sha na na na na na....
Sha na na na na na na na ...
Agora aguente firme

Cante para mim mamãe, [ mamãe]
Cante isto de forma doce e pura, oh!
Mamãe deixe-me ouvir aquele velho rock de ninar

Nós fazemos isto durantes os dias solitários
Mas, Senhor, as noites eram longas.
E nós sonhávamos com manhãs melhores
Quando mamãe cantava a canção.
Agora eu não consigo lembrar as palavras de jeito nenhum,
Não faz sentido tentar
Pois eu simplesmente sabia que muito amor vinha através
Daquele rock de ninar.

E ela cantava sha na na na na na na na
Vai ficar tudo bem
Sha na na na na na na na
Agora me segure firme

Eu posso te ouvir mamãe
Nada cura minha alma
como o som do bom velho Rock de Ninar