terça-feira, 24 de novembro de 2009
Um comentário
Eu não pensei que pudesse causar reações tão desproporcionais com uma postagem, como aconteceu com a última. Em primeiro lugar, pela falta de relevância deste blog. Recebo apenas as visitas fiéis de todos os dias: mãe, marido, filho e alguns poucos amigos. Em segundo, pela certeza de que não havia nada de ofensivo ou desrespeitoso no meu texto, que pudesse provocar tais reações. Eu apenas falava sobre parte de uma palestra proferida por uma professora da Unicamp. É claro que ao divulgá-la aqui, de certa forma, tomo uma posição. No mundo da ciência, tomar posição é direito de todos nós. Da mesma forma que é dever, respeitar aqueles que defendem uma idéia diferente da nossa. Quase todos os comentários deixados neste "post" (a grande maioria de pais e mães de crianças com diagnóstico de dislexia) foram agressivos, desrespeitosos e ofensivos. E o mais curioso é que, as duas posições, opostas no que se refere ao conteúdo das idéias, estavam exatamente de um mesmo lado, no que se refere ao objetivo maior: a busca da melhor maneira de atender às reais necessidades de crianças que apresentam problemas no desempenho escolar. No entanto, ele (o objetivo) ficou perdido no meio de tantos ataques. Uma pena.
segunda-feira, 9 de novembro de 2009
Dislexia existe?
O que já foi cegueira verbal congênita, lesão cerebral mínima, dislexia específica de evolução, dislexia de desenvolvimento, entre outros nomes, é hoje a tão falada e tão pouco conhecida dislexia. Na Câmara Municipal de São Paulo, há um projeto de lei do vereador Juscelino Gadelha (PSDB), feito em parceria com a ABD (Associação Brasileira de Dislexia) e já aprovado em primeira instância, que propõe um programa para diagnosticar alunos disléxicos em toda a rede de ensino, e encaminhá-los para tratamento. Especialistas de Instituições como o Conselho Regional de Psicologia, a USP e a Unicamp são contrários à aprovação do projeto por acreditarem que a dislexia, como doença neurológica de quem tem dificuldades para ler e escrever, nunca foi devidamente comprovada. Segundo eles, um projeto assim contribui apenas para a estigmatização de crianças, desconsiderando as questões sociais. No dia 21 de setembro deste ano, houve um seminário na Câmara, para se discutir o tema antes da segunda votação. Uma das palestrantes convidadas, a Doutora Maria Aparecida Afonso Moyses, professora titular em Pediatria Social da Unicamp, fez uma brilhante explanação sobre as razões da não aprovação do projeto pelas Instituições citadas. Ela traz inicialmente a definição da doença mais aceita pelos autores e entidades que defendem a existência da dislexia e à partir daí, vai questionando a falta de embasamento científico, tanto para o reconhecimento da dislexia como distúrbio neurológico, como para a forma como é feito o diagnóstico. Segundo esta definição oficial, a dislexia seria um distúrbio neurológico, que comprometeria apenas a escrita e a leitura. Para confirmação, utiliza-se instrumentos de escrita e leitura. Ou seja, usa-se linguagem escrita para diagnóstico da dislexia que tem como único comprometimento justamente a linguagem escrita. Do ponto de vista médico e científico, isso é totalmente contraditório. Uma avaliação assim só vai confirmar a existência da própria dificuldade e não, se há ou não distúrbio neurológico. Durante a palestra, a professora Maria Aparecida questiona a falta de rigor científico em alguns exames. Um exemplo é a existência de simetria de neurônios no plano frontal para comprovação do diagnóstico de dislexia. A falha no rigor é mostrada num estudo (curiosamente do mesmo autor que defende esse diagnóstico) que mostra que 16% da população "normal" também tem a tal simetria. Um outro exemplo é a presença de ectopia neuronal (quando um neurônio que deveria estar numa região, vai para outra), em algumas áreas do cérebro. Aqui, a falta de rigor está na ausência de estudos da ectopia neuronal na população dita normal. Para a professora, é complicado dizer que uma doença neurológica se caracteriza por questões que também estão presentes em qualquer pessoa que tenha dificuldade para ler e escrever, pelos mais diferentes motivos. Ela dá como exemplo exames de neuroimagem que precisam ativar o cérebro na função que está sendo avaliada. No caso da dislexia, essa ativação se dá, novamente, por meio de instrumentos de escrita e leitura. Uma pessoa que não sabe ler, em consequência de uma alfabetização mal sucedida por exemplo, pode ter essa função diminuída como uma reação saudável a testes que tenham como objetivo avaliar seu desempenho em leitura. São duas as principais questões que ela nos deixa: uma, se as dificuldades em leitura e escrita não seriam reflexo da diversidade, não só de seres humanos, como também das condições a que estão expostos e não, consequência de distúrbios neurológicos. A outra, se os exames de neuroimagem não detectariam a consequência no cérebro de não saber ler, e não, a sua causa.
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
De casinha pode, de espada não?
Um menino de 4 anos presenciou há pouco tempo um assalto à mão armada, na casa de seus avós. A avó conta que, alguns dias depois, ele pegou um guarda-chuva e começou a brincar de atirar, como se fosse uma metralhadora e que o pai, preocupado, tentou desviar sua atenção para outras coisas. Da mesma forma que a criança brinca de casinha ou de escolinha para experimentar diferentes papéis e assim, entender melhor como é que as coisas se dão, precisa também das brincadeiras de polícia e ladrão ou de guerra para assimilar experiências traumáticas e violentas. Não há necessidade, portanto, de que os pais, em nome da paz, proíbam este tipo de brincadeira. Uma espada de brinquedo, certamente, não fará com que a criança se torne violenta, até porque, ela consegue muito bem separar realidade e fantasia. É claro que, depois de uma situação traumática como a que viveu este menino, não precisamos dar aos filhos um revólver de brinquedo na esperança de que elaborem o trauma. Eles sabem como transformar objetos em brinquedos que atendam suas necessidades. O fazer de conta que um guarda-chuva é uma metralhadora é um sinal importante de que a criança, por meio da fantasia, está tentando dar conta da realidade. Só o que podemos fazer, é ficar por perto e atentos aos limites que eles próprios acabam nos pedindo.
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